21 abr/14

Bonzinhos S.A.

postado por Diogo Branco

Deve ser culpa da minha avó. 
Eu juro, querido leitor, são 23 anos me ferrando de maneira irrestrita, e eu precisava culpar alguém que não fosse eu mesmo. 
Que me perdoe minha progenitora, mas só ela sabe o quanto me aconselhava em seu acalanto. Aprendi desde cedo a enaltecer e reconhecer virtudes, dentre elas, uma há muito tempo à beira da extinção: A generosidade. No mundo da mesquinharia ilimitada e do "eu primeiro" em que vivemos, encontrar generosidade não é tarefa fácil, nem nunca foi. Me lembro do dia em que acenei para um carro, com o objetivo de avisar que a porta traseira estava aberta, e em troca recebi um sonoro "vai tomar no *". O mundo, de fato, não está mais acostumado com gentilezas.
Generoso é aquele que dá sem esperar algo em troca. Mais do que engloba o conceito financeiro, cabem ainda nessa virtude as pequenas ações gratuitas do dia a dia: Um abraço, um olhar, um momento de atenção, ou "a partilha de nossos ensinamentos e do nosso amor irrestrito", como afirmam os budistas. Quanto ao abraço e ao olhar, nunca tive problemas, mas no quesito amor... Eu e minha avó nos demos mal: Ela por ter suportado, calada, inúmeros episódios de traições, e eu por teimar em acreditar nos outros.
Dia desses marquei um encontro com uma pessoa. Acertamos nossos horários e combinamos de sair. Em suma: Ficamos eu, minha cerveja e os músicos do barzinho, apenas. Nenhum  telefonema, mensagem ou sinal de fumaça que me indicasse satisfação pela ausência foi apresentado a mim.Preocupado, liguei para a pessoa e combinamos um novo encontro, no dia seguinte. Novamente, tomei minha cerveja sozinho e sem nenhum motivo plausível. Sim, foram dois bolos em dias seguidos, da mesma pessoa e no mesmo local, inclusive. Os músicos já me olhavam com pena.
Pois é, veja você, aqui estou eu desabafando através desse texto. Logo eu, que sempre condenei os que compartilham os (raros) momentos de vída privada que temos hoje em dia. Mas vai servir de exemplo e lição pra alguém.
Sobre o episódio descrito acima, cabe: Generoso, eu ??? Não. Escalei o muro da generosidade e caí no terreno da burrice. Nesse terreno, inclusive, existe uma àrea reservada para os bonzinhos que só se fodem, na qual eles se reunem numa espécie de sociedade anônima. Lá estão os bonzinhos de várias estirpes, inclusive aquele tipo que liga para a pessoa que o esqueceu na noite passada. Em estágios avançados, eles recebem certificado e o título de "tolos", e a partir daí caem na real e podem sair do terreno da burrice, mas há poucos relatos. É raro existir um bonzinho que deixe um dia de ser.
No fundo, eles sabem que a vida lhes reserva uma grata surpresa.
Os mais velhos garantem que, num primeiro momento, pode haver uma imensa chateação ao perceber que o título de "tolo" foi pregado na sua testa, mas o tempo faz tudo valer a pena, e a vida se encarrega de retribuir no momento certo. Os grandes de alma sabem que, na verdade, a vida é muito simples: Você só recebe aquilo que dá, e bem como cada ação caridosa, cada pensamento que temos está gerando o nosso futuro.



Diogo Branco

Site cultural de Ribeirão Preto

Desde 2013 propagando arte e cultura.